A artrose de quadril ou coxartrose é uma doença caracterizada pela degeneração da articulação do quadril com desgaste da cartilagem e consequente perda do espaço articular e da conformação da articulação, muitas vezes causando dor e diminuição da amplitude de movimento (mobilidade). Em estágios mais avançados, ocorre a formação de ossos chamados osteófitos. Eles crescem em locais indevidos para tentar estabilizar uma articulação com a biomecânica alterada, contribuindo para diminuição da mobilidade e dor.
EPIDEMIOLOGIA E ETIOLOGIA
A coxartrose é mais comum no idoso e no gênero feminino, pois geralmente é resultado de anos de danos ao quadril. Por muito tempo, acreditou-se que a principal causa da doença era idiopática (causa desconhecida, sem algo que justifique). No entanto, com o aprimoramento do conhecimento sobre a articulação do quadril e sua biomecânica, muitas artroses outrora consideradas idiopáticas foram reconhecidas com algum dos inúmeros fatores causais dessa doença. Sabemos que além da idade avançada, a obesidade, a herança genética, a sobrecarga articular, os traumas e as doenças inflamatórias articulares (artrite reumatoide, por exemplo) são fatores causais muito comuns.
Um profissional capacitado deve reconhecer o quanto antes os fatores de risco e atuar não só no tratamento, como também na prevenção da artrose e seus estágios mais avançados.
Ao contrário do que muitos pensam, não é uma doença exclusiva de idoso. Muitas causas estão ligadas ao desenvolvimento de coxartrose, inclusive sequelas de doenças da infância como: infecção do quadril, doença de Legg-Calve-Perthes, Displasia do Desenvolvimento do Quadril (DDQ), Epifisiólise da Cabeça Femoral. A artrose nesses indivíduos pode se manifestar quando ainda são adultos jovens. Outra causa de artrose nesta faixa etária é a Necrose Avascular da Cabeça do Fêmur, que é de evolução rápida e tem aumentado muito o número de casos por ter como uma das causas possíveis a sequela ao COVID (leia o artigo sobre Necrose Avascular da Cabeça do Fêmur).
O DIAGNÓSTICO DE ARTROSE DE QUADRIL
O diagnóstico da artrose de quadril deve ser aventado pela história clínica do paciente e o exame físico. A dor na região da virilha (podendo ser em outras regiões ao redor do quadril) é a queixa mais comum. No entanto, devido a inervação e biomecânica complexa do quadril, a dor pode se manifestar na coluna ou até mesmo no joelho, exigindo maior cuidado e conhecimento para chegar ao diagnóstico correto. Outro sintoma frequente é a limitação da mobilidade do quadril, a qual sempre deve ser avaliada pelo ortopedista que suspeita de coxartrose. Em alguns pacientes, essa limitação impede o paciente de colocar meias e calçados, dificulta o caminhar, impede de cruzar as pernas e, em casos mais avançados, até de abrir as coxas (dificuldade de abduzir o quadril).
Para comprovar uma artrose suspeitada pelas queixas do paciente e o exame físico, na maioria das vezes uma radiografia (exame de raio x) de bacia é suficiente. As alterações que observamos no exame de um quadril com artrose são: perda da esfericidade da cabeça do fêmur; diminuição ou assimetria do espaço articular; formação de osteófitos e cistos ósseos, dentre outras a depender da causa.
TRATAMENTO
O tratamento da coxartrose depende de muitos fatores como: a gravidade da coxartrose (grau); do impacto na qualidade de vida; da idade do paciente; da ocupação profissional; da rotina do paciente; do grau de independência para atividades da vida diária; do índice de massa corporal (IMC); da causa da coxartrose; da expectativa do paciente quanto aos resultados do tratamento. Todas as opções para um determinado caso devem ser bem esclarecidas ao paciente, para que a decisão possa ocorrer em conjunto, sempre visando a melhora da qualidade de vida do paciente.
Tratamento conservador
O tratamento conservador (sem cirurgia) pode ajudar bastante em alguns casos, principalmente os mais leves e a depender da causa. Consiste na perda de peso em pacientes com IMC elevado, fortalecimento da musculatura com fisioterapia e atividade física, evitar atividades de impacto na articulação do quadril. O tratamento do sintoma da dor pode ser realizado com analgésicos comuns (paracetamol, dipirona), anti-inflatórios esteroidais (corticoides) e não esteroidais (nimesulida, diclofenaco…) e pode-se lançar mão dos bloqueios de nervos e infiltrações articulares (com corticoide e ácido hialurônico, por exemplo) guiados por ultrassom ou escopia (raio x). O uso oral de colágenos, glicosamina e condroitina também pode ser apresentado como opção de tratamento, esclarecendo seus possíveis benefícios e limitações para cada caso.
Dependendo do impacto na qualidade de vida do paciente, o tratamento cirúrgico é a melhor solução. A principal opção é a Artroplastia Total de Quadril (ATQ). Ela consiste suscintamente em “raspar” o osso do acetábulo, região em que a cabeça do fêmur se encaixa na pelve, e substituir por um implante de metal e outro material que pode ser polietileno (um tipo de plástico), cerâmica, dentre outros, e de retirar a cabeça do fêmur com a cartilagem e osso ruim e substituir pelo implante femoral. Os componentes acetabulares e femorais podem ser fixados de forma cimentada (cimento ósseo) ou não-cimentada (por pressão). A escolha dos implantes e forma de fixação envolve conhecimento técnico e habilidade do cirurgião. Cada caso deve ser avaliado e planejado para que o cirurgião chegue à escolha ideal do implante.
Portanto, se você já escutou falar que prótese não-cimentada é melhor que a cimentada, ou vice-versa, de forma generalizada, essa é uma afirmação equivocada.
Existe ainda a Artroplastia Parcial do Quadril, em que não colocamos um implante fixado no acetábulo, apenas substituímos o osso ruim do fêmur. Esse tipo de artroplastia tem uma durabilidade menor do que a ATQ e, portanto, fica reservado para pacientes mais idosos que já tem outras limitações de saúde e pouco deambulava. Tem seu uso mais frequente em paciente com fratura do colo do fêmur. A artrose no acetábulo contraindica essa escolha.
Existem muitos mitos e medos quando se fala em colocar uma prótese. Dentre eles o medo de rejeição da prótese, baixa duração dos benefícios da cirurgia, medo de passar muito tempo sem andar ou até de não voltar a andar (ora, esta é uma cirurgia realizada para fazer o paciente andar rápido, muitas vezes no dia seguinte a cirurgia e sem dor), medo do ato cirúrgico e do procedimento anestésico, por exemplo. O desconhecimento traz o medo, portanto, considero que uma consulta bem realizada com esclarecimento de todas as dúvidas, vai fazer o próprio paciente perceber se a Artroplastia Total de Quadril é uma boa opção de tratamento ou não.
Quando bem indicada, a ATQ é uma das cirurgias, em toda a medicina, que traz mais benefícios, rápidos e duradouros, não à toa foi eleita “a cirurgia do século” pela revista The Lancet desde 2007. Importante falar que todo procedimento médico, por menor que seja, envolve algum risco, no entanto, é justamente quando o benefício é muito maior do que os riscos envolvidos, que uma cirurgia pode ser realizada.